No momento em que o Brasil passa por uma crise política e moral, cabe a todos nós refletirmos sobre a formação dos cidadãos, que perpassa pela escola e pelo educador. Para desafiar os professores do ensino fundamental de Gramado, a Secretaria da Educação propôs uma noite de formação continuada com a Mestre em Avaliação Educacional, Jussara Hoffmann, responsável pela publicação de mais de 200 livros voltados à formação de professores. O encontro, que reuniu cerca de 200 profissionais, ocorreu no Expogramado, na última terça-feira (27).
“Nós precisamos discutir que princípios temos em nossas escolas, pois é muito difícil formar cidadãos com valor. A escola foi feita para ser um ambiente de segurança, de acolhimento, de amor”, com essas colocações, a educadora iniciou a palestra Avaliação mediadora: observação, reflexão e reconstrução das práticas educativas.
A palestrante, que atua há mais de 40 anos como professora de escolas públicas e particulares, e foi professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é criadora da teoria de avaliação mediadora e, em suas obras, desafia o mito da avaliação classificatória.
No encontro, Jussara abordou as concepções teóricas da avaliação educacional e a importância da organização de um novo ambiente educativo para favorecer a aprendizagem dos alunos em todas as áreas do conhecimento, valorizando seus diferentes jeitos de ser e de aprender, estabelecendo uma maior conexão entre os alunos, os professores e os processos pedagógicos utilizados.
A educadora defende que a escola e o professor são os agentes fundamentais na formação dos alunos para a vida, no seu desenvolvimento intelectual e moral, na formação de jovens autônomos, críticos, participativos, responsáveis pela sua vida, pela dos outros e pelo bem do planeta. Mas para tal, deve-se valorizar as singularidades e diferenças individuais de cada aluno, e o grande desafio do professor hoje nesse contexto é dialogar, desafiar e apoiar esse jovem estudante.
“O ambiente necessário para o desenvolvimento moral e intelectual é aquele que instiga, que encoraja cada um dos alunos a propor soluções, a compreender diferentes pontos de vista, a justificar seu raciocínio, a validar suas próprias opiniões no coletivo”, garante.
Corrigir não é avaliar. Interpretar é avaliar
De acordo com a educadora, o processo de avaliação classificatória é vago, pois não é capaz de apontar falhas. Corrigir uma prova, dar uma nota não significa avaliar o estudante. É necessário interpretar e compreender para se ter uma avaliação efetiva da aprendizagem e o processo exige conhecimento por parte do professor.
“Uma das competências básicas do professor é ter o domínio da escrita e da leitura, mas é importante que ele busque conhecimentos, e há uma clara distinção entre informação e conhecimento”, comenta ela. “Conhecimento como desenvolvimento moral e intelectual é o único que transcende a instituição educacional”, completa.
A educadora aponta algumas diferenças entre uma avaliação classificatória e mediadora. A primeira cabe em julgar, testar, medir, comparar, classificar, ver resultado e registrar. Já na segunda, a avaliação que sustenta, caberia ao professor observar, interpretar, compreender, acompanhar, orientar, mediar e promover o aluno.
“A perspectiva mediadora de avaliação é uma abertura para possibilidades amplas de aprendizagem, levando em conta uma vasta gama de variáveis, percursos imprevisíveis, criativos, acompanhados por uma grande flexibilidade de organização curricular, visando a projeção do futuro desse aluno”, relata Jussara.
De acordo com a sua teoria, os alunos que obtém boas notas, na maioria dos casos, aprendem como passar no exame adotando práticas de memorização, por exemplo. Esses alunos estão longe de alcançar um melhor desenvolvimento, que só seria atingido pela aprendizagem, compreensão, questionamentos e participação.
Para Jussara Hoffmann, requer ao avaliador mediador: criar oportunidades, espaços e tempos de acordo com os objetivos pretendidos e as possibilidades cognitivas dos alunos; ser um guia, estando disponível e atento aos caminhos de cada aluno e do grupo; organizar sempre atividades de grande grupo, pequeno grupo e individuais; escutar/registrar/documentar o que cada um sabe e/ou necessita expressar.
Professores aprovam a capacitação
O professor de matemática da Escola Municipal de Ensino Fundamental Henrique Bertolucci Sobrinho, Lucas Vieira, comentou que possui um aluno acima da média na matéria e que tem se destacado muito na classe. Ele questionou à educadora se esse estudante deveria participar de uma competição, como a Olimpíada de Matemática. Jussara reforçou que o objetivo principal de uma avaliação mediadora é elevar a autoestima e despertar a capacidade intelectual do aluno, mas nunca o forçar a participar. “A Olimpíada deve ser uma prioridade sua e não da escola, nem da família. Mas a escola tem papel fundamental nesse incentivo. Para o aluno será uma experiência de vida. Não importa se irá vencer ou não”, salienta.
Lucas já havia participado de uma palestra com Jussara e disse sempre despertar reflexões acerca dos temas que aborda. “Ela traz uma outra forma de enxergarmos nossos alunos. Ela provoca a gente”, comenta.
A vice-diretora da Escola Municipal de Ensino Fundamental Dr. Carlos Nelz (CAIC), Luciana Giacometti, disse ser muito importante a atividade para reciclagem. “Sempre estamos conversando sobre avaliação, mas também vale fazermos uma auto-avaliação, se estamos fazendo um bom trabalho”, declara.
A secretária da Educação, Gilça Silva, informou que durante o ano mais ações para formação continuada serão ofertadas aos professores. A próxima engloba a educação infantil. “Hoje a Jussara nos brindou com essa palestra. Na realidade, ela nos mostrou o caminho para um processo que é muito importante no desenvolvimento do aluno, o da avaliação”.